Chico Buarque

Ópera

Chico Buarque

Ópera do Malandro


(Adaptação e texto de Chico Buarque sobre trechos de Rigolleto, de Verdi, Carmen, de Bizet, Aida de Verdi, La Traviata, de Verdi e Tannhauser, de Wagner
Para a peça Ópera do malandro, de Chico Buarque)
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João Alegre:
Telegrama
Do Alabama
Pro senhor
Max Overseas
Ai, meu Deus do céu
Me sinto tão feliz

Terezinha:
Chegou a confirmação
Da United coisa e tal
Que nos passa a concessão
Para o náilon tropical

Max:
Então nós vamos montar
Em São Paulo um fabricão

Teresinha:
Depois vamos exportar
Fio de náilon pro Japão

Max:
Sei que o náilon tem valor
Mas começa a me enjoar
Tive idéia bem melhor
Nós vamos ramificar

Teresinha:
Já ramifiquei, ha ha
Fiz acordo com a Shell
Coca-Cola, RCA
E vai ser sopa no mel

Coro:
Que beleza
Que riqueza
Tá chovendo
Da matriz
Ai, meu Deus do céu
Me sinto tão feliz

Max:
Que tal juntarmos
Esses capitais
Pra abrir um banco
Em Minas Gerais

Teresinha:
Que brilhante idéia, meu amor
Que plano original
Com fundos do exterior
Você fundar
Um banco nacional

Capangas de Max:
E eu que já fui
Um pobre marginal
Sem documento
E sem moral
Hei de ser um bom profissional
Vou ser quase um doutor
Contínuo da senhora
E do senhor
Bancário ou contador

Coro:
Que sucesso
O progresso
Corta o mal
Pela raiz
Ai, meu Deus do céu
Me sinto tão feliz

Chaves:
Irmão
Nem começar eu sei
Receio te inibir

Max:
Tua vontade é lei
É falar
É mandar
É exigir

Chaves:
É que
Num mundo tão cruel
Cheio de inveja e fel
Não lhe fará mal
Ter à mão
Proteção
Policial
Quer os meus préstimos?


Max:
Eu acho ótimo


Barrabás:
(auxiliar de Chaves)

Serve um acólito?


Max:
Também vou te empregar


Lúcia:
Eu não
Tenho com quem deixar
Meu filho que já vem


Max:
Barrabás é um par
Exemplar
Quer casar
E adora neném


Coro:
Maravilha
Que família
Dois pombinhos
E um petiz
Ai, meu Deus do céu
Me sinto tão feliz


Vitória:
Só tenho um único
Breve reparo
A tão preclaro
Genro viril
É o esquecimento
Do sacramento
Afinal
Se casou
Só no civil
Oh oh oh
Oh oh oh
Só no civil
Oh oh oh
Oh oh oh
Só no civil


Max:
Mas nesse ínterim
Mudei de crença
Já peço a bênção
No santo altar


Vitória:
Que maravilha
Não perco a filha
E um varão
Bonitão
Eu vou ganhar
Ah ah ah
Ah ah ah
Eu vou ganhar
Ah ah ah
Ah ah ah
Eu vou ganhar


Duran:
Duran
Minha filha eu desejo pedir teu perdão


Teresinha:
Oh, meu pai, isso é bom demais!Finalmente! Até que
enfim!


Duran:
Duran
Não sei como fui pra você tão durão
Tão mandão, tão sem coração
Tão malvado assim


Max:
Meu sogro, o senhor não sabe
Quanta alegria
Me dá, ao dizer que já se juntou
Aos nossos


Duran:
Só Deus sabe há quanto tempo
Eu tanto queria
Poder apertar
esses ossos


Coro:
Que alegria
Quem diria
Como os grandes
São gentis
Ai, meu Deus do céu
Me sinto tão feliz


Duran:
Não quero ser
Nas suas costas um fardo
Porém, talvez
Eu necessite um resguardo


Max:
Tua instituição
Tão tradicional
Vai ter um padrão
Moderno
Cristão e ocidental


Funcionárias de Duran:
Vamos participar
Dessa evolução
Vamos todas entrar
Na linha de produção
Vamos abandonar
O sexo artesanal
Vamos todas amar
Em escala industrial


Todos:
O sol nasceu
No mar de Copacabana
Pra quem viveu
Só de café e banana
Tem gilete, Kibon
Lanchonete, Neon
Petróleo
Cinemascope, sapólio
Ban-lon
Shampoo, tevê
Cigarros longos e finos
Blindex fumê
Já tem Napalm e Kolinos
Tem cassete e rai-ban
Camionete e sedan
Que sonho
Corcel, Brasília, plutônio
Shazam
Que orgia
Que energia
Reina a paz
No meu país
Ai, meu Deus do céu
Me sinto tão feliz



1977 © by Cara Nova Editora Musical Ltda.
Compositor: Chico Buarque

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