Há exatos 40 anos o primeiro álbum dos Ramones chegava às lojas de discos dos EUA. Apesar de ter feito pouquíssimo sucesso, esse é um daqueles casos de disco em que quase todo mundo que o comprou acabou montando uma banda. Explicar o impacto e a influência desse trabalho é tarefa difícil, mas não é exagero dizer que praticamente todo o rock que veio depois dele deve algo, ou muito, à sua existência.

Os Ramones mostraram que dava para ser original mesmo usando uma fórmula em tese absurda - canções com cerca de dois minutos, sem solos e tocadas com muita velocidade - mais ainda em uma época em que o rock estava tomado por excessos de todos os tipos.

Ainda que muitos estudiosos acreditem que eles teriam deixado um legado ainda maior se tivessem encerrado a carreira no final da década de 70, é injusto ignorar os trabalhos feitos por eles depois de 1977. Ainda que eles não tenham a mesma força dos três primeiros discos, há sempre algo de digno em cada um dos álbuns que se seguiram até 1995, quando eles se despediram.

A audição da obra da banda também mostra que apesar de terem trabalhado com uma paleta limitada, a história de que eles "sempre fizeram o mesmo disco" não é verdade. Há sempre algo de diferente em cada um de seus álbuns, mais ainda pelo fato deles terem trabalhado com um sem número de produtores.

No especial abaixo falamos sobre cada um dos discos de estúdio gravados por Joey, Johnny, Dee Dee, Tommy, Marky, Richey e CJ Ramone.



Ramones - 1976
Ramones
Ramones Ramones
Gravado em apenas uma semana e a um custo irrisório, temos aqui alguns dos 29 minutos mais influentes da história do rock. O primeiro álbum do quarteto pode não ter vendido muito quando saiu (não foi além do 111° lugar da parada americana), mas causou barulho o bastante para influenciar praticamente todo o rock que se seguiu.

A fórmula era incrivelmente simples: músicas curtas e rápidas, com poucos acordes e nenhum solo. O segredo da banda foi o de temperar essa brutalidade com melodias assobiáveis, quase pop.

Sim, é o tipo de música que não é muito difícil de se fazer - não a toa milhares de bandas começam tocando covers deles - mas ter tal ideia já é mais complicado, e foi essa a tacada genial dos quatro.

Ramones está cheio de clássicos da banda e , por consequência, de todo o rock. Entre os destaques, estão "Blitzkrieg Bop", o primeiro single que abre com a clássica contagem "one two three four" que se tornaria marca registrada deles, a singela "I Wanna Be Your Boyfriend" e, o seu total oposto, a casca grossa "53rd & 3rd" - em que Dee Dee relembra os dias em que fazia programas para sustentar seu vício em drogas pesadas. Eles também homenageiam o lado mais trash do pop americano ao regravarem "Let's Dance", hit de Chris Montez.

A mixagem do disco também merece ser lembrada, já que ela foi feita à moda dos discos dos anos 60 com a voz e bateria centralizadas, a guitarra em um canal e o baixo no outro, o que torna a sua audição em fones de ouvido um tanto bizarra.



Leave Home - 1977
Ramones
Ramones Leave Home
Com Tony Bongiovi (primo do Jon Bon Jovi) assumindo a produção junto com Tommy Ramone, esse álbum é uma sequência de estreia, novamente com músicas curtas e sem muita firula, por isso ele não é tão celebrado quanto a estreia, apesar de suas inegáveis qualidades.

Aqui temos mais uma fornada de clássicos - "Glad To See You Go", "Pinhead (com o grito de guerra "Gabba Gabba Hey)", "Gimme Gimme Shock Treatment" e mais uma regravação de um hit pop dos anos 60. A escolhida desta vez foi "California Sun" sucesso com os Rivieras.



Rocket To Russia - 1977
Ramones
Ramones Rocket To Russia
Para muitos fãs esse é o grande álbum da banda. Fechando a trilogia com a formação - e fórmula musical - original, "Rocket To Russia - 1977", tem mais uma vez uma seleção irrepreensível de 14 faixas em cerca de trinta minutos (31 para sermos exatos).

A lista de faixas é inacreditável: "Teenage Lobotomy", "Cretin Hop", "We're A Happy Family" e o grande single que não aconteceu "Sheena Is A Punk Rocker".
As duas covers também se tornaram clássicas na versão deles.

"Do you wanna dance?" - de Bobby Freeman mais conhecida aqui na versão de "Johnny Rivers - está entre as melhores covers feitas por eles e "Surfin' Bird", original dos Thrashmen foi a faixa que ajudou, tardiamente, a banda fazer sucesso no Brasil - ela tocava bastante em rádios como a 89 FM no meio dos anos 80. O álbum marcou a despedida de Tommy Ramone da bateria, que queria dedicar-se apenas à produção de discos.



Road To Ruin - 1978
Ramones
Ramones Road To Ruin
O primeiro disco a contar com Marky Ramone, mostra os Ramones deixando a sua música um pouco mais acessível. O produtor Ed Stasium, ao lado de Tommy Ramone, dá mais clareza ao som do quarteto, que agora engloba canções que tinham tudo para serem grandes hits radiofônicos - especialmente "I Wanna Be Sedated" - e baladas como "Questioningly".

Johnny segue sem se preocupar em fazer solos, mas deixa um pouco de lado o estilo "motosserra" dos três primeiros álbuns. A cover da vez, "Needles And Pins" dos Searchers é novamente um dos destaques.

Apesar de todas as tentativas, o trabalho mais uma vez naufragou comercialmente, não indo além da 103° posição na Billboard. Um grande retrocesso, já que "Rocket..." chegou no 49° lugar.



End Of The Century - 1980
Ramones
Ramones End Of The Century
A dança de produtores continua. Agora quem assume a a tarefa de gravar a banda é ninguém menos que o lendário Phil Spector, o rei do pop americano do início dos anos 60.

Spector ficou famoso por criar a chamada "parede sonora", um som poderoso e de certa forma brutal, conseguido ao se gravar vários instrumentos, sempre em pares ou mesmo trios, simultaneamente. Ou seja, ao menos em tese o encontro dele com os Ramones tinha tudo para funcionar, já que os novaiorquinos tinham apreço por tal sonoridade e nunca esconderam seu amor pelos trabalhos do produtor.

O problema é que Spector também era um notório paranoico e controlador, do tipo que só gravava com um revólver por perto - para o caso de alguém querer sumir com as fitas. Seu perfeccionismo também era notório. Assim a banda se viu gravando takes e mais takes das canções com cada parte tendo que ser tocada à exaustão pelos músicos.

Era óbvio que essa situação geraria um conflito em algum momento, especialmente em uma banda que tinha desajustados e briguentos entre os seus membros. A história de "End Of The Century" segue envolta em mistérios. Dee Dee por exemplo disse que abandonou as gravações e não sabe quem tocou no disco. Ele também falou que os quatro foram mantidos reféns na casa de Spector - algo que Marky mais tarde negou.

Agora a dúvida: todo esse esforço valeu a pena? Comercialmente em termos, Nos EUA ele chegou no 44° posto e no Reino Unido em 14° o melhor resultado deles em toda a carreira, mas muito longe das ambições dos quatro, que esperavam finalmente atingir o grande público com um disco mais pop e acessível.

Do ponto de vista musical o resultado é irregular, mas os momentos de brilho superam os tropeços com certa vantagem, vide "Do You Remember Rock 'n' Roll Radio?", "Danny Says" (que melhorou horrores depois de passar pela mão do produtor, O CD remasterizado tem uma demo que serve de comparação), "Chinese Rock" (composta por Dee Dee e Richard Hell em 1977 e gravada originalmente por Johnny Thunders) e "Rock'n'Roll High School".

A cover da vez não poderia ter sido outra senão uma canção produzida por Spector nos anos 60. A versão para "Baby, I Love You" das Ronettes é outro destaque do álbum, ainda que ela conte apenas com Joey e Johnny na gravação - e um time de primeira de músicos de estúdio.



Pleasant Dreams - 1981
Ramones
Ramones Pleasant Dreams
O produtor da vez é o ex-10 CC Graham Gouldman nessa que é a última tentativa da banda de atingir o mainstream - não à toa eles queriam Steve Lillywhite (dos primeiros álbuns do U2) na função.

As canções aqui também passam a ser creditadas individualmente e não mais à banda - são cinco faixas de Dee Dee e sete de Joey. Apesar de hits em potencial incluindo um quase pedido para que as rádios os tocassem - "We Want The Airwaves" - o sucesso novamente não veio.

"Pleasant Dreams" não passou do 58° posto da Billboard e também marcou o início do afastamento entre Joey e Johnny depois que o guitarrista roubou-lhe a namorada, algo que deixou o vocalista ressentido pelo resto de sua vida, como soube-se posteriormente. O cantor falou sobre o assunto de forma cifrada em "The KKK Took My Baby Away", uma das melhores faixas desse disco simpático ainda que um tanto inconsequente - o primeiro deles sem nenhuma regravação.



Subterranean Jungle - 1983
Ramones
Ramones Subterranean Jungle
Em 1983 praticamente toda a geração de bandas que surgiram com os Ramones seja nos EUA ou Inglaterra, já tinha encerrado suas atividades, independentemente de terem sido bem sucedidas comercialmente ou não.

O quarteto poderia ter seguido por esse caminho, ainda mais pelo fato de seus integrantes cada vez menos se aturarem.

Ainda assim eles decidiram seguir tocando para o seu público que podia não ser numeroso mas era fiel e suficiente para garantir-lhes a sobrevivência.

"Subterranean..." é um disco estranho e não muito marcante. Produzido por Ritchie Cordell (outro hitmaker dos anos 60) ao lado de Glen Kolotkin, o álbum é lembrado por sua ordem de faixas um tanto sem sentido. Ele começa com duas covers e uma terceira versão. Dessas, a mais inusitada é a de "Time Has Come Today, clássico da soul music dos Chambers Brothers.

No restante, dessa vez temos mais música de Dee Dee (seis, uma em parceria com Johnny, a clássica "Psycho Therapy") que de Joey (três). Na parada americana ele chegou no 83° lugar.



Too Tough To Die - 1984
Ramones
Ramones Too Tough To Die
A dupla Tommy Ramone e Ed Stasium volta a produzir a banda nesse disco que é marcado pela chegada do baterista Richie Ramone, que temporariamente substituiu Marky, e de quebra compôs "Humankind".

"Too Tough..." tem um som mais contemporâneo, visto especialmente em "Howling At The Moon", mas também acenos ao som mais primal dos primeiros álbuns - a instrumental "Durango 95" e canções mais velozes, quase hardcore - como "Wart Hog" e "Endless Vacation".

O único álbum deles a ter três faixas que ultrapassam os quatro minutos, ele também é marcado por ter diversas parcerias entre os seus integrantes e, pela primeira vez, canções escritas com a ajuda de não membros do grupo.

Nas paradas o álbum amargou um 171° lugar, mas Too Tough To Die é um dos melhores discos dessa fase intermediária da banda.



Animal Boy - 1986
Ramones
Ramones Animal Boy
Pouco lembrado, e não muito bem recebido pela crítica, "Animal Boy", pode ser irregular, mas tem ao menos um single luminoso, a excelente "My Brain Is Hanging Upside Down (Bonzo Goes to Bitburg)", e outros momentos bastante dignos - "Somebody Put Something In My Drink" de Richie e "Something To Believe In".

A produção ficou nas mãos de Jean Beauvoir (que foi dos Plasmatics) em um trabalho mais uma vez dominado pelas composições de Dee Dee e que não foi bem na parada americana - 143° lugar.



Halfway To Sanity - 1987
Ramones
Ramones Halfway To Sanity
Outro disco não muito lembrado, esse saiu alguns meses depois da primeira visita deles ao Brasil. Os Ramones tocaram em São Paulo em 31 de janeiro e 1° de fevereiro de 1987. Foram dois shows por noite em apresentações marcadas por várias brigas entre punks e skinheads na porta do extinto Palace.

Produzido por Daniel Rey, esse é um disco mais recomendado para os fanáticos do que o ouvinte casual. O maior destaque vai para "I Wanna Live", mas "Go Lil Camaro Go" (com participação de Debbie Harry do Blondie e "Bye Bye Baby" também valem a atenção.



Brain Drain- 1989
Ramones
Ramones Brain Drain
O álbum marca um reencontro - a volta de Marky Ramone - e uma despedida, a de Dee Dee, que compôs boa parte das músicas mas praticamente não deu as caras no estúdio.

Produzido pelo vanguardista Bill Laswell junto com os já habituais Jean Beauvoir e Daniel Rey, "Brain Drain" é lembrado por "Pet Sematary", talvez seu maior hit comercial e por "I Believe In Miracles", uma das melhores músicas de toda a carreira deles. O resto é novamente irregular, mas é sempre possível encontrar algumas canções redentoras no final.

Ainda que "Pet Sematary" tenha chegado no top 5 da parada de "rock moderno" da Billboard, o álbum chegou só na 122ª colocação. Ainda assim, 50 posições a mais que o álbum anterior.



Mondo Bizarro- 1992
Ramones
Dee Dee pode ter saído, CJ Ramone o substituiu, mas sua sombra ainda estava presente na banda. Ele escreveu três canções aqui - segundo ele em troca de dinheiro para que pagasse a fiança para não ser preso por conta de seu cada vez mais problemático vício em drogas.

O fato de que duas dessas faixas estavam entre as melhores do disco - "Poison Heart", que tocou muito por aqui, e "Strength To Endure" - mostram como ele era fundamental na engrenagem.

"Mondo Bizarro" foi o primeiro disco dos Ramones a sair pela Radioactive Records, depois de terem lançado toda sua obra anterior na Sire.

Apesar das expectativas, e da produção de Ed Stasium, o disco não decolou. Mesmo tendo saído no auge do estouro do rock alternativo, quando incontáveis artistas de sucesso citavam a banda como fundamental em suas vidas, ele chegou no 190° posto da Billboard, o pior resultado de toda a carreira deles.



Acid Eaters- 1994
Ramones
Ramones Acid Eaters
Os Ramones nunca esconderam seu amor pelo rock dos anos 60. Logo, não foi surpresa vê-los gravando um álbum de covers com canções da época. O álbum anterior já tinha uma versão para "Take it as it Comes" dos Doors, a primeira vez que uma cover de uma banda "séria" dava as caras em um álbum deles.

Em "Acid Eaters" eles homenagearam basicamente o rock feito entre 1966 e 1968 de tintura psicodélica. Dentro desse recorte as escolhas são ampla e o resultado bastante divertido.

Seja relembrando bandas pouco lembradas como os Amboy Dukes, Seeds e Troggs ou canções de artistas consagrados - Bob Dylan, Rolling Stones, Jefferson Airplane e The Who (com direito a participação de Pete Townshend e tudo) a banda consegue dar a sua cara a essas canções. Produzido por Scott Hackwith, o álbum mais uma vez teve vendas decepcionantes e chegou no 179° lugar da parada.



¡Adiós Amigos!- 1995
Ramones
Ramones ¡Adiós Amigos!
Cansados de tocar sem parar e só serem verdadeiramente reconhecidos na América do Sul - onde são tidos como banda grande, tocando para milhares de pessoas - e com as relações entre seus membros cada vez mais deteriorada, a banda decide se despedir.

É difícil saber se esse adeus era para ser mesmo definitivo ou se uma reconciliação pudesse ocorrer no futuro. Mas as mortes sucessivas de Joey (2001), Dee Dee (2002), Johnny (2004) e Tommy (2014) acabaram com toda e qualquer esperança de retorno.

"¡Adiós Amigos!" pôs um ponto final em uma das histórias mais fascinantes, e tristes, de todo o rock. O álbum, novamente dominado por músicas de Dee Dee, não chega a empolgar, mas ele funciona em alguns momentos, especialmente na cover para "I Don't Want To Grow Up" de Tom Waits e em "Life's A Gas" composta por Joey.