Já faz tempo o batizado Garanto não ser chalaça No cálice bento a cachaça Fez a vez do vinho sagrado Eu caí em tentação No primeiro sacramento A roupinha de pagão Virou emplastro e unguento De mirra, mijo e marafo E como se fosse um Te-Deum Cantaram um samba na igreja Era Ataulfo ou Noel?
E a gente sentia no bafo A força da tal patuleia Quando após o santo ofício Foi-se aos pastéis com cerveja E um coro desafinado Cantava Saudades da Amélia
Recitativo
Algum tempo depois Eu, aquele menino Numa taberna de glórias Entre pastéis, empadinhas Eis que ouvi um Benguelê (Eram grilhões e senzalas De uma África inteira Que em renda e alfazema Se corporizava ali Corimas e caxambus E cantos de pastorinhas E jongos, lundus, ladainhas) E disso guardei memória Do seu Outeiro Desceu em Glórias Clemente Senhora Cantando um Agnus Dei
Num silêncio de Oratório Fez então seu ofertório Meus olhos verdes benzeu E formou-se a procissão E eram negros Pastores, pastoras Mulatos, ateus e carolas Judeus, mães-de-santo Mulheres da vida E homens da vida também, enfim E no andor, Mãe Quelé Comandando os excluídos A mais fina flor da melhor ralé!
Quanto de amor e doçura Deu-me aquela criatura Quando seu canto de fé espargiu Naquela baderna, na Glória Outra voz tão linda assim Nem mesmo Deus eu acho que ele ouviu!
Compositor: Vidal Assis/Hermínio Bello de Carvalho