Um Lugar Em Decomposição
SEJA BEM VINDO A UM LUGAR QUE DEUS ESQUECEU;
SEJA BEM VINDO A UM CAPÍTULO DA HISTÓRIA QUE O DEMÔNIO ESCREVEU;
OS PERSONAGENS AQUI NÃO SÃO HERÓIS NÃO;
NA NOSSA HISTÓRIA ESTÃO NO CEMITÉRIO OU NA DETENÇÃO;
OU NO MEIO DO MATO SE TRANSFORMANDO EM CARNIÇA;
COM VÁRIOS TIROS NO CORPO, ESPERANDO O IML QUE VIRÁ UM DIA;
tô COM O PASSADO NA MENTE E EU ME LEMBRO;
DE CADÁVERES ENSANGÜENTADOS, FULANO SENTANDO O DEDO;
INÚMEROS ENTERROS, QUANTOS NO IML POR MIGALHAS;
QUANTOS LUTANDO POR CENTÍMETROS DE CELA, SE MATANDO POR NADA;
NO BRASIL É MUITO FÁCIL MORRER POR LIXO OU SER PRESIDIÁRIO;
SE TEM RANGO O EDUARDO É SANTO, PRATO VAZIO O EDUARDO É DIABO;
IMAGINE O DEMÔNIO DO TEU LADO TE INCENTIVANDO;
VENDO SEUS FILHOS COM FOME CHORANDO;
QUALQUER UM ENTOPE O CANO E SAI PRA VER QUAL QUE É;
BEBE O SANGUE DE QUALQUER PLAYBOY, TROCA COM A ROTA, VENHA QUEM VIER;
ME COLOCO NO LUGAR, RESPEITO OS MOTIVOS;
TIVE TODOS INGREDIENTES, MOTIVOS PRA SER BANDIDO;
NUM CORTIÇO DO GLICÉRIO VEM A MINHA INFÂNCIA;
UM QUARTO E COZINHA QUE MAL CABIA A FAMÍLIA, NÃO TRAZIA ESPERANÇA;
O CHÃO DESTRUÍDO, CAINDO AOS PEDAÇOS;
O CORREDOR COM ÁGUA DE ESGOTO COM MAU CHEIRO E MERDA POR TODOS OS LADOS;
A INCERTEZA SOBRE O RANGO, PUTA QUE O PARIU;
SERÁ QUE HOJE TEM COMIDA OU SERÁ MAIS UM PRATO VAZIO;
SEREI MAIS UM FINADO NA RUA COMO LIXO;
SEREI MAIS UM DETENTO MORRENDO NO PRESÍDIO;
TALVEZ SEJA UM ASSASSINO EU VOU MATAR ALGUÉM;
OU TALVEZ SEJA SÓ MAIS UM TRABALHADOR ME FODENDO PRA SER NINGUÉM;
A LIÇÃO QUE NOS ENSINAM É FÁCIL APRENDER;
METER BO, TROCAR TIRO, NO MEU TERRITÓRIO, MEU LUGAR É MATAR OU MORRER;
IGUAIS Á MIM VI VÁRIOS COM UM OITÃO NA MÃO ENGATILHANDO;
ANOS DEPOIS ALGUNS VELÓRIOS, ALGUNS FINADOS, ALGUMAS MÃES CHORANDO;
O MOTIVO É O BRASIL UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO;
QUE NÃO INCENTIVA, QUE NÃO VALORIZA, QUE NÃO DÁ OPÇÃO;
É UMA DOENÇA SEM CURA EM ESTADO TERMINAL;
É O CORREDOR DA MORTE, É UMA INJEÇÃO LETAL;
QUE FUTURO TEM UMA CRIANÇA;
QUE TEM POLÍCIA E UMA PEDRA DE CRACK COMO SUA HERANÇA;
QUE TEM LEMBRANÇA DE UM CADÁVER SE DECOMPONDO LOGO CEDO;
QUE TEM UMA CALIBRE DOZE COMO SEU BRINQUEDO;
QUE VÊ SUA MÃE SEMPRE TRISTE DE CANTO CHORANDO;
SEM DINHEIRO, COMIDA, QUASE SE ENTREGANDO;
AQUI SÓ OLHAM QUANDO O SANGUE ESCORRE;
QUANDO UM DE NÓS MATAM UM FILHO DA PUTA;
OU ASSALTAM UM BANCO OU NA NOSSA MORTE;
NÃO DEMORA MUITO ATÉ FECHAREM A TAMPA DO CAIXÃO;
AFINAL ISSO AQUI É BRASIL, UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO.
SEJA BEM VINDO A UM LUGAR QUE DEUS ESQUECEU;
Á UM CAPÍTULO DA HISTÓRIA QUE O DEMÔNIO ESCREVEU;
AQUI NÃO SE SONHA NÃO;
A MORTE É TÃO COMUM NUM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO;
UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO, UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO.
OLHA BEM PARA AQUELAS GRADES, PARA AQUELA GENTE;
NÃO NASCERAM CRIMINOSOS OU ARMADOS ATÉ OS DENTES;
VEJAM AQUELE BARRACO E AS CRIANÇAS BRINCANDO NA ÁGUA DE ESGOTO;
FILHOS DE UMA MÃE QUE DEVE ESTAR PEDINDO ESMOLAS;
OU DE UM PAI QUE DEVE ESTAR MORTO;
O FUTURO É BEM PREVISÍVEL, NÃO VÃO TER CURSO SUPERIOR;
NÃO VÃO VIRAR ADVOGADOS, EMPRESÁRIOS, ALI NÃO TEM NENHUM DOUTOR;
EU ACREDITO NA PERIFERIA, NAS FAVELAS, NOS CORTIÇOS;
MAS TAMBÉM SEI QUE CHEGAR AOS 20 NESSE LUGAR É UM MILAGRE ESTAR VIVO;
É UMA GUERRA ONDE O CAIXÃO QUE SE ENTERRA É O DO MAIS FRACO;
A MORTE ESTÁ MAIS PERTO QUANDO SE TENTA IR MAIS ALTO;
ME BASEIO EM EXEMPLOS, SEI AONDE LEVA ESSE CAMINHO;
VI QUEM TENTOU A SORTE DESCENDO NUM CAIXÃO DOADO E SOZINHO;
INÚMERAS VEZES MANOS ALGEMADOS NO BANCO DE TRÁS DA VIATURA;
INÚMERAS VEZES VÁRIAS LÁGRIMAS E FLORES NA SEPULTURA;
O MEU LUGAR SE DECOMPÔS COMO TODOS OS BAIRROS POBRES;
DOS PIVETES QUE JOGAVAM BOLA QUASE 80% JÁ TROMBARAM SUA MORTE;
NINGUÉM ESTÁ TRISTE SE TEU CORPO ESTÁ NO IML;
O QUE IMPORTA PRO BRASIL É DINHEIRO, A COR DA SUA PELE;
NINGUÉM ESTÁ TRISTE COM MILHARES DE CRIANÇAS JOGADAS NA RUA COMO LIXO;
O QUE IMPORTA É QUE NÃO VENDAM DOCES;
NÃO PEÇAM ESMOLAS NOS ÔNIBUS, NO FAROL, NO SEU VIDRO;
CUSPIR NA CARA DE UM MOLEQUE ENROLADO NUM COBERTOR É MUITO FÁCIL;
MAS TROMBAR UM ADULTO COM UM 38 NA SUA CABEÇA É MAIS EMBAÇADO;
AQUI SE CRIA O DEMÔNIO COM UMA BOA DOSE DE VENENO;
OLHAR DE NOJO, PALMAS NO ENTERRO;
DEPOIS NÃO ADIANTAM AS LÁGRIMAS NA HORA DO SEQÜESTRO;
NO ASSALTO Á BANCO, NO HOMICÍDIO, QUANDO O CÉU VIRA INFERNO;
QUANDO SE APERTA UM GATILHO O TIRO QUE SAI É PRA MATAR;
QUANDO SE DÁ UMA FACADA É PRA SANGRAR;
AJOELHAR NA CRUZ, NINGUÉM VAI TE OUVIR;
AQUI SE COLHE O QUE SE PLANTA É FÁCIL RESUMIR;
DESCASO DA SOCIEDADE, OLHOS FECHADOS DOS POLÍTICOS;
ESQUECIMENTO Á UMA CLASSE QUE SE DESTRÓI;
DIA A DIA TROCANDO TIRO, MORRENDO NO PRESÍDIO;
QUEM NASCE PRA SER ENTERRADO ÁS VEZES VIRA O JOGO;
O DEMÔNIO QUE VOCÊ POLÍTICO CRIA;
É O MESMO QUE ENFIA BALA NO SEU PRÓPRIO CORPO;
DEFUNTO NA RUA, IML, CRIANÇAS COMENDO LIXO;
HOMICÍDIO, POLÍCIA, CADEIA SUPER LOTADA, O RETRATO DE UM PAÍS FALIDO;
NÃO DEMORA MUITO ATÉ FECHAREM A TAMPA DO CAIXÃO;
AFINAL ISSO AQUI É BRASIL, UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO.
(2X) SEJA BEM VINDO A UM LUGAR QUE DEUS ESQUECEU;
Á UM CAPÍTULO DA HISTÓRIA QUE O DEMÔNIO ESCREVEU;
AQUI NÃO SE SONHA NÃO;
A MORTE É TÃO COMUM NUM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO;
UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO, UM LUGAR EM DECOMPOSIÇÃO.
Compositores: Carlos Eduardo Taddeo (Eduardo), Washington Roberto Santana (Dumdum), Erick Cohen (Erick 12)
ECAD: Obra #620143 Fonograma #605748